No dia de aniversário levei-lhe um ramo de flores e um presente. Tomámos café e conversámos um pouco. Ela não sabia que no dia seguinte seria surpreendida. Despedi-me e segui para o encontro de amigas. Outro aniversário.
No dia seguinte, a tal festa surpresa. Alguns irmãos, sobrinhos e sobrinhos netos. A mesa estava posta. As flores pequeninas, em vasos, e velas acesas enfeitavam o espaço... Uma grande surpresa! Bem merecida.
Mas fiquei atónita... Não aceitou as duas plantas que havia comprado em nome de todos.
- Não quero. Já me deste o ramo ontem. Gostei muito.
No fim de semana seguinte ao meu aniversário, tomei a decisão de fazer um convívio só com os meus irmãos e seus respectivos cônjuges, quem os tem, claro.
Apesar da presença de irmãos não ser na totalidade, éramos quase vinte.
Uma trabalheira, mas repleta de felicidade.
Já há muito que não os via deste modo, em festa. Relaxados, descontraídos, adolescentes, pareciam... Pudera, sem filhos ou netos para se distraírem ou preocuparem...
E, também, porque, os últimos "encontros", foram de despedida.
Todo o dia não se proporcionou para um momento que queria especial, "o silêncio", pelos que já partiram. O meu pai, a minha mãe e irmão. Os mais recentes, ambos, no mesmo ano, um a seguir ao outro.
O entardecer estava mágico, próprio do fim de um dia quente no campo. E foi ainda debaixo do grande guardassol que jantamos. Depois, anoiteceu e já outra mesa, dentro de casa, esperava-nos para as sobremesas...
E foi o momento certo. Interrompi a alegria e conversas cruzadas de alguns. Pedi meio minuto de silêncio. Não é necessário descrever o que aconteceu. Nem eu sei, porque, no final das palavras, transbordei de tanta emoção... Os parabéns foram cantados como um hino, como um escape, como uma oração...
Houve abraços apertados. Abraços que jamais esquecerei...
E a festa continuou.
Quando nos lembramos de tirar fotos, já o céu reluzia estrelado, mas lá bem longe :)
Gosto de sentir liberdade, quem não gosta?... De não me submeter a regras, programas, agendas... Sempre que é possível, e sem prejuízo do outro. A vida já é tão cheia de obrigações!
Porque, a par de nossas vidas diárias, familiares, há outras vidas, familiares e não familiares... Há trabalhos e canseiras, doença, dedicação e zelo, carinho, amor.
A primeira etapa de tratamentos passou e parece estar no bom caminho...
Quando nasceste do mesmo ventre, correste na grande varanda de tábuas, rangendo, brincaste no mesmo terreiro, em noites de luar. E nadaste no pequeno rio, em dias quentes de verão, fizeste as refeições em volta da mesma mesa, debaixo do mesmo telhado... Aí, sentes todo o universo a chamar-te e a dizer-te que toda a pessoa merece atenção, cuidado, proteção.
Só por uns tempos. Sei... Até uma nova etapa que brevemente reiniciará e nunca se sabe como acabará... Andei por aí, tentando aliviar, de cabeça oca, vazia de problemas...
Ontem, aproveitei a noite para sair: jantar e assistir a um concerto ao ar livre, no Largo da Condessa do Juncal. À inconfundível voz de Sofia Escobar, juntou-se a Orquestra Juvenil de Pevidém e música tocada em piano, a solo... Tudo divinal. Arrepiei-me e emocionei-me por várias vezes. Não perdi pitada. Tentei absorver cada palavra, cada som, cada momento musical.
Não se deve falar nem pensar mal das pessoas que já partiram. Vamos aprendendo que ninguém é perfeito e que as circunstâncias da vida, por vezes, fazem-nos mais carrancudos, impacientes e senhores do nosso nariz.
Ser pai de doze filhos é obra. E sendo a obra feita quase toda no masculino, pensava-se e dizia-se que ainda era muito mais difícil. Muiiito macho. Entretanto, descobriu-se que, afinal, é mesmo o pai que, em última instância determina o género do bebé. Mas o que interessa é que, naquele tempo, era competência do pai, somente, e ponto final.
Era com grande orgulho que nos dias de festa, Natal e Páscoa, os rapazes desfilavam por ordem decrescente de idade, escadas acima, em direcção ao coro da igreja. As mulheres jovens e não só, disfarçadamente, miravam a bela equipa de lindos e educados rapazes que, raras vezes, percorriam os caminhos da aldeia. Meu pai, nesses dias, também os acompanhava, e, com certeza, fazia-o a transbordar de alegria, orgulho e felicidade.
No final da missa, minha mãe não podia perder tempo com grandes esclarecimentos ao mulherio que a abordava para saber pormenores sobre os seus filhinhos. Sei que conversava com esta e aquela, alegre e apressada, porque havia o almoço próprio do dia, que só ela tão bem sabia confeccionar.
O que conversavam com o meu pai, não sei. Já seria conversa de homens... Ou não.
Um dia meu pai partiu... Pensava eu que não ia ser tão difícil, assim. Mas o mundo desabou. Aí, compreendi que a vida de pai não é nada, nada fácil. E que a vida sem ele nunca mais foi a mesma coisa.
Pois... É verdade. Natal também é tempo de trabalheira.
Não me posso queixar... Apenas elaborei uns pequenos arranjos, coloquei-os por ali e por acolá para assinalar a época. Fiz rabanadas, aletria e peras bêbedas. Algumas doçuras. As preferidas cá da gente de casa. Ah! E comprei presentes.
Os almoços e jantares, esses, foram em casa de familiares. Chego a ter compaixão daqueles que nos recebem. Tanta gente! Trinta, quarenta?!... Por aí.
Os presentes alegram a criançada. Papéis e laços espalhados pelo chão. Jogos de mesa, sorrisos, conversas em tom maior e, por vezes, cruzadas...
Há encontros que são de longa distância...Temos de aproveitar cada instante... Porque a hora de partir é já.
E pronto, termina o Natal, o tal que esperamos um ano inteiro. Despedidas, abraços, risos, saudades e um até breve ou até qualquer dia.
Restam-nos algumas doçuras e lembranças que prolongam o tempo de natal...
Onde estão as dicas para que, no tempo de natal, possamos estar de cabelos bem arranjados em todos os almoços a que vamos?
Difícil, não? Um almoço, dois almoços, três... Teríamos de os lavar quase todos os dias.
O que costumo fazer é dar prioridade... Então, escolhi o almoço de família para estar mais produzida. Pintei o cabelo e ficou lavadinho, solto e levemente esticado. Seja lá quem for fica com outro ar... Desde que o penteado não seja em forma de capacete... ;)
Depois, é óptimo ouvir irmãos, cunhadas e sobrinhos elogiar o nosso estado. Porque, apesar de... Aidade não passa... E tal e quê...Ó cunhado, para quando outra criança?... Ó tia, tens as calças rotas nos joelhos... :)
Entre amigos, tanto elogio pode soar falsidade. Em família, não. É um modo carinhoso de comunicar, um modo de dizer que gostamos, que somos família, que os laços estendem-se com o tempo. Sempre.
Li muito pouco neste verão, porque passei o tempo a saltar de um lado para o outro.
Faço parte de famílias grandes que vivem espalhadas por todo o lado, com seus afazeres e sem um ponto que os motive ao reencontro. Assim vão passando os anos. Antes que a razão do encontro familiar fosse um triste encontro, e antes que o tempo nos vença, organizei dois convívios. Exigiu muita estratégia, coordenação, trabalho...
Por isso, relaxar sem nada fazer, nem sequer ler, também é essencial.
Um certo dia de nevoeiro e chuva miudinha, estava à beira mar, caminhando pelas ruas da cidade, quando encontrei uma loja de livros em 2ª. mão. Comprei dois livros, pequenos mas intensos no seu conteúdo. Carta ao Pai de Franz Kafka e A Instrumentalina e OutrosContos de Lídia Jorge. Custaram-me 7 euros.
Posso dizer-vos que acertei em cheio. É impressionante como me revi nos dois géneros de escrita e estórias. Adorei. Adorei. Porque, como vou dizendo, os livros que vão de encontro às minhas raízes, ao mais profundo e desconhecido de mim, eu sei lá, aqueles que me deixam a matutar durante meses, ou uma vida... Esses são os meus preferidos.
E fiquei feliz por esta descoberta, assim, espontaneamente, num passeio descontraído, pelas ruas da cidade.